No passado, os doentes terminais morriam em casa. Era essa a cultura vigente. Os doentes e as famílias aceitavam que o fim se aproximava, resignavam-se. Preferiam morrer acompanhados, velados pelo seu mundo, em paz.
Hoje em dia, ninguém morre em casa. Os doentes são trazidos para o hospital para morrerem. Assistimos diariamente a esta realidade. Esta dura realidade. 90 anos, 95 anos. Neoplasias, metástases. Dor, agonia, magreza, escaras. Nada a fazer senão aliviar a dor, oxigenar, hidratar.
Os doentes no hospital morrem numa maca. Durante a noite, muitas vezes sem ninguém por perto, sem ninguém a quem dar a mão. Morrem a olhar para paredes brancas, assépticas. Morrem sem perceberem onde estão, para onde os levaram.
Quando a minha vez chegar, eu quero morrer em casa. Eu quero sentir a mão de quem gosta de mim. Não quero que me piquem um braço, não quero sentir soro a correr, não quero ser algaliado, não quero comer por uma sonda. Quero reconhecer as paredes à minha volta, a minha mesa de cabeceira e os meus lençóis. Ver fotografias nossas nas molduras, objectos de uma vida cheia, feliz.
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Quando chegou o momento de dizer adeus ao meu Pai, foi dificil conseguir traze-lo para casa. Não fora um médico amigo que nos ajudou, e que também nos aconselhou uma excelente enfermeira disponivel para alguma urgência nocturna, não o teriamos sequer conseguido.
O meu Pai, homem lúcido e inteligente, sabia que ía morrer. Nós também. Saber que o acompanhámos nos seus ultimos dias com amor, com entrega incondicional, permitindo-lhe viver mais esta fase com dignidade, é talvez o maior consolo que sinto quando recordo aquele que é o momento mais duro da minha vida.